Não comprovada hipótese de culpa exclusiva da vítima, de terceiro, ou a excelência do sistema, a instituição financeira deve ser responsabilizada pela ação de fraudadores, pois se trata de fortuito interno.

Com base nesse entendimento, a 22ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo condenou um banco a restituir valores a um cliente que foi vítima do golpe da troca de cartões em um caixa eletrônico. As transações questionadas totalizam R$ 12 mil.

De acordo com os autos, o cliente usou um caixa eletrônico dentro de um supermercado para efetuar um saque. Após retirar o dinheiro, ele disse que foi abordado por um homem desconhecido, com a informação de que a tela do caixa estaria aberta com seus dados. 

Ao retornar ao caixa eletrônico, foi solicitada a inserção do CPF e do número da conta e, em seguida, o cartão travou. O homem ofereceu ajuda e conseguiu retirar o cartão. Só após deixar o local, o autor percebeu que o cartão que lhe entregaram estava em nome de outra pessoa. 

O banco se recusou a devolver o valor das transações efetuadas pelos golpistas sob o argumento de culpa exclusiva da vítima. No entanto, segundo o relator, desembargador Edgard Rosa, se o banco disponibiliza seus serviços em caixas eletrônicos em estabelecimentos comerciais, deve garantir a segurança necessária aos clientes.

“O autor foi induzido a erro ao entregar o seu cartão, nas dependências de um supermercado, em caixa eletrônico de autoatendimento (24 horas), no qual foram disponibilizados serviços aos seus clientes, em local que se mostrou destituído de segurança necessária como forma de evitar a prática de fraudes como a dos autos”, afirmou.

Segundo o magistrado, ainda que a fraude tenha ocorrido fora das dependências do banco, a instituição financeira, ao oferecer o serviço de autoatendimento em outros estabelecimentos, fora de suas agências, assume o dever de garantir que ele será prestado de forma segura e eficiente, tudo de modo a evitar a atuação de criminosos.

“Cabendo-lhes cuidar para que tais caixas eletrônicos possuam a necessária segurança (vigilância), tudo como forma de evitar tais situações, assegurando-se um mínimo de privacidade aos clientes, que não deveriam ficar expostos à ação de terceiros no momento em que realizam as transações”, acrescentou Rosa.

Assim, o magistrado concluiu pela culpa preponderante, por flagrante omissão no dever de vigilância e segurança, da instituição financeira: “Isso sem falar da responsabilidade decorrente do fato de, na sequência, aceitar a realização de inúmeras operações anômalas, extraordinárias, destoantes da prática rotineira com que o cliente fazia uso de seu cartão”.

Rosa afirmou ainda que a mesma segurança que o banco oferece em suas agências, também deve propiciar nos locais onde há terminais de autoatendimento, sempre tendo em vista a tranquilidade e a segurança dos clientes. Além disso, o relator destacou que as compras efetuadas pelos golpistas destoaram completamente do perfil do autor.

“Em tais situações, em que o uso do cartão é anômalo (compras e saques sucessivos, todos no mesmo dia e de valores não usuais, fora do perfil do cliente), incide a responsabilidade objetiva pela falha do serviço, pois o sistema de segurança não foi hábil a ponto de detectar a hipótese de anormalidade e, desde logo, travar as operações, confirmando-as somente após concordância do cliente”, disse.

Danos morais não reconhecidos
O relator negou o pedido do cliente por indenização por danos morais. Para Rosa, a situação não desbordou de um mero aborrecimento e não teve o condão de atingir a esfera do direito de personalidade, isto é, de ofender a dignidade pessoal do autor.

“O banco-réu, no caso, também foi vítima da ação criminosa do estelionatário e, por sua culpa, em não atuar de modo a evitar a consumação do golpe, arcará com a reparação dos danos materiais (ou prejuízo das operações impugnadas), não sendo o caso, entretanto, de também arcar com indenização adicional por dano moral”, concluiu Rosa. A decisão foi por maioria de votos.

Divergência
O desembargador Campos Mello divergiu do relator e votou pela culpa concorrente entre banco e cliente. Para ele, o banco deveria restituir 50% das transações impugnadas, uma vez que o autor também foi negligente “ao permitir que o meliante pudesse tomar conhecimento de sua senha, provavelmente ao digitá-la na presença de terceiro”.

Fonte: CONJUR


Por: Livio Sabatti

Publicado em: 23 de março de 2022

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