O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ajuizou no Supremo Tribunal Federal (STF) a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5679, com pedido de liminar, contra o artigo 2º da Emenda Constitucional (EC) 94/2016, na parte em que insere o artigo 101, parágrafo 2º, incisos I e II, no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal. A norma questionada trata da possibilidade de utilização de depósitos judiciais para pagamento de precatórios.
O dispositivo define que, para o pagamento de débito representado por precatórios, além dos recursos orçamentários próprios, poderão os estados, o Distrito Federal e os municípios utilizar até 75% do montante de depósitos judiciais e administrativos referentes a processos judiciais nos quais sejam partes (assim como autarquias, fundações e empresas estatais dependentes) e até 20% dos demais depósitos judiciais da localidade, sob jurisdição do respectivo tribunal de justiça.
Para o procurador-geral, a medida ultrapassou os limites de reforma à Constituição estabelecidos pelo poder constituinte originário ao poder constituinte derivado e violam cláusulas pétreas relativas à divisão das funções estatais e aos direitos e garantias individuais.
“Destinar recursos de terceiros, depositados em conta à disposição do Judiciário, à revelia deles, para custeio de despesas ordinárias do Executivo e para pagamento de dívidas da fazenda pública estadual com outras pessoas constitui apropriação do patrimônio alheio, com interferência na relação jurídica civil do depósito e no direito fundamental de propriedade dos titulares dos valores depositados”, afirma.
Acesso à justiça
Segundo o procurador-geral, o artigo 5º (incisos XXXV e LXXVIII) da Carta Federal garante o direito a prestação jurisdicional razoável e célere. “Tal garantia seria meramente formal se não incluísse os atos executivos para satisfação do direito da parte. O direito fundamental de acesso à justiça não assegura apenas que o estado encerre o litígio, mas impõe que materialize com a brevidade possível os direitos reconhecidos pela sentença proferida”, sustenta.
“A Emenda Constitucional 94/2016, de modo diverso, disponibiliza não apenas 75% do montante dos depósitos judiciais e administrativos em dinheiro, referentes a processos judiciais ou administrativos, tributários ou não tributários, nos quais o poder público seja parte, como também considera instrumento para solução do débito até 20% dos demais depósitos judiciais da localidade. Na imensa maioria destes casos, como é intuitivo, o poder público não está presente na relação jurídica processual”, diz.
Para Janot, a emenda também viola o princípio da proporcionalidade, na sua face de proibição à proteção insuficiente, uma vez que tal inovação cria situação inusitada à parte processual em favor de quem tenha sido expedida autorização judicial. Segundo argumenta, ao buscar os valores depositados, a parte não terá garantia de dirigir-se à instituição financeira e obter disponibilidade deles, como hoje ocorre, pois dependerá da condição de liquidez efetiva do fundo de reserva.
Pedidos
O procurador-geral requer liminar para suspender o artigo 2º da EC 94/2016, na parte que insere o artigo 101, parágrafo 2º, incisos I e II, do ADCT. Ele argumenta que, caso isso não ocorra, poderá haver, a qualquer momento, transferência de bilionário montante de depósitos judiciais dos tribunais de justiça para o Executivo dos entes da federação, “com consequências potencialmente irreversíveis para a liquidez imediata que devem ter esses recursos, sobretudo em face da situação financeira notoriamente crítica de não poucos estados-membros e muitos municípios”.
No mérito, pede que seja declarada inconstitucionalidade do dispositivo. O relator da ação é o ministro Luís Roberto Barroso.
Fonte: STF
Por: Sabatti Advogados
Publicado em: 3 de novembro de 2020
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