É possível obrigar plano de saúde a pagar pela criopreservação (congelamento) de óvulos de beneficiária, se a infertilidade for efeito colateral decorrente de tratamento médico coberto pelo contrato. Esse custeio, no entanto, só deve durar até o momento em que a paciente receber alta do tratamento principal. A partir daí, a manutenção e utilização dos óvulos são de responsabilidade da contratante.

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu parcial provimento ao recurso especial de um plano de saúde para determinar que o mesmo custeie a criopreservação dos óvulos de uma paciente que terá de passar por quimioterapia, mas somente enquanto durar o tratamento. O julgamento ocorreu nesta terça-feira (26/5), por videoconferência.

Relator do caso, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino fez uma diferenciação com a jurisprudência tranquila do STJ segundo a qual plano de saúde não precisa pagar por inseminação artificial. O procedimento é excluído da cobertura pelo artigo 10º, inciso III da Lei 9.656/1998 e por resolução da Agência Nacional de Sáude Suplementar (ANS).

O caso julgado, no entanto, é diferente: a paciente tem câncer de mama e precisa passar por quimioterapia, que tem como um dos efeitos colaterais a possibilidade de infertilidade. Assim, incide o artigo 35, alínea F, que aponta que a assistência garantida “compreende todas as ações necessárias à prevenção da doença e a recuperação, manutenção e reabilitação da saúde”.

A proposta inicial do relator era de obrigar o plano de saúde a pagar somente a retirada dos óvulos. Uma vez fora do corpo da paciente e livres da quimioterapia, passariam ao contexto de reprodução assistida, fora da cobertura. Nesta terça, a ministra Nancy Andrighi trouxe voto-vista mais abrangente, que por fim acabou totalmente incorporado pelo ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Para a ministra, se o contrato determina obrigação de cobrir o tratamento por quimioterapia, obriga também a custear a criopreservação. Ao final do tratamento, estando a paciente curada da doença, poderá lhe ser devolvida a chance de exercer a maternidade a seu critério e no momento oportuno. A operadora deve pagar o congelamento dos óvulos até que ela receba alta do tratamento,.

Sem exageros
A proposta da ministra Nancy Andrighi foi exaltada pelos colegas de 3ª Turma como equilibrada e razoável. Ela evita exageros. A ministra cita, por exemplo, que a criopreservação não tem prazo máximo, podendo ser estendida sem prejuízo aos óvulos por tempo indeterminado.

E segundo dados do Conselho Regional de Medicina, mulheres têm capacidade de engravidar por inseminação artificial, na média, até os 50 anos idade. Como a paciente tem quase 30 anos de idade, manter a decisão de segundo grau poderia obrigar o plano de saúde a arcar com a criopreservação dos óvulos por quase duas décadas.

“É uma solução criativa que incorpora e expande o voto do relator. Os dois votos têm uma preocupação humanística muito evidente”, exaltou o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para quem a decisão não interfere indevidamente no contrato do plano de saúde. O recurso foi parcialmente provido por unanimidade.


Por: Livio Sabatti

Publicado em: 3 de novembro de 2020

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