A decisão judicial ou administrativa que impede a imprensa de acessar dados públicos com base no possível uso que se fará dos mesmos configura inequívoca censura. E a existência de portal que eventualmente forneça essas informações não afasta o direito líquido e certo de obtê-las a pedido.

Com esse entendimento, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça deu provimento ao recurso do Grupo Folha, que fora impedido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo de acessar lista dos registros de entrada de corpos nas unidades do IML no município de São Paulo, por meio de dados constantes de delegacias de polícia.

A decisão foi unânime, conforme o voto do relator, ministro Og Fernandes. “É um caso Kafkiano. Você vê que o dono da informação quer dar a informação, mas o tribunal entende que não deve”, comentou o ministro Mauro Campbell.

A corte paulista proibiu a divulgação dos dados sob alegação de risco à segurança e à privacidade dos familiares das vítimas, pela exposição em reportagens. E ainda apontou ausência de interesse de agir, já que as informações seriam posteriormente publicadas em portal de acesso público.

O ministro Og Fernandes destacou que não é função da administração pública ou do Judiciário apreciar as razões ou usos que se pretende dar às informações de natureza pública. “A informação, por ser pública, deve estar disponível ao público, independentemente de justificações ou considerações quanto aos interesses que se distinga o uso”, disse.

O relator destacou que a postura do TJ-SP configura bis in idem censório: impediu o acesso à informação pública e a liberdade de imprensa, direitos que são autônomos e não se confundem.

Ressaltou que a hipótese sequer é de produto jornalístico acabado, que poderia gerar “de forma absolutamente excepcional e, ainda assim, questionável”, um controle de sua circulação, diante dos potenciais danos que poderia causar. Haveria, assim, diversas formas de aproveitar tais dados como subsídio à atividade jornalística.

“Configura inequívoca censura prévia impedir-se a imprensa que até mesmo apure eventual interesse jornalístico de divulgação de dados, reitere-se, inequivocamente públicos”, disse o ministro Og.

Segundo ele, segurança individual não é hipótese de exceção de acesso a dados públicos. Eventuais danos, caso efetivados, se resolvem pela responsabilização civil, administrativa ou penal.

“A existência de portal com dados públicos solicitados apenas configura meio de cumprimento da obrigação de fornecer acesso ao solicitante, mas não enseja a rejeição de pedido de informações nem afasta seu direito líquido e certo de tê-las”, concluiu. A previsão consta do parágrafo 3º do artigo 11 da Lei de Acesso à Informação.

REsp 1.852.629


Por: Livio Sabatti

Publicado em: 3 de novembro de 2020

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